Café conilon: Produtores antecipam colheita e enfrentam mercado em baixa
Ívna Ferreira
Longo período sem chuva afetará diretamente na produção cafeeira deste ano, principalmente no quesito qualidade. A safra terá quebra de até 25%
No Espírito Santo, a colheita do café conilon é aberta no dia 14 de maio. A data foi estabelecida para evitar que os produtores colhessem o fruto antes do tempo ideal. Dessa forma, se garantiria a uniformidade de maturação dos grãos e mais qualidade ao produto.
No entanto, a colheita da safra 2016/2017 pode ser iniciada já no próximo mês. Isso porque o período de estiagem prolongado está antecipando a maturação do café. “Então, como nós temos aqui os clone com maturação precoce, em abril nós provavelmente teremos que colher este café”, conta o gerente de comercialização da Cooperativa Agrária dos Cafeicultores de São Gabriel (Cooabriel), Edmilson Calegari.
Devido às condições climáticas de cada região, todos os anos há localidades onde o café amadurece primeiro, afirma o gerente do Comércio Café da Cooperativa Agropecuária Centro Serrana (Coopeavi), João ElvídioGalimberti. “Este ano já há relatos de produtores que começaram a colher o seu café. O conilon tem um tempo de colheita diferente do arábica, por exemplo, assim como o conilon da região com maior altitude amadurece um pouco mais tarde que aqueles que estão na região mais quente”, explica.
No Norte e Noroeste do Estado, no ano com regimenormal, as regiões recebem de 1.200 a 1.300 mm de chuva anualmente. No ano de 2015, foram apenas 490 mm. “Isso na realidade vai comprometer muito a nossa colheita”, afirma Calegari.
Influência do clima na qualidade do café
O longo período sem chuva, ou com irregularidades, dos últimos anos afetará diretamente na produção cafeeira deste ano, principalmente no quesitoqualidade. Visto que, com a intensidade menor de água, os grãos tendem a sofrer uma má-formação, ficando menores. “A falta de chuva e as temperaturas elevadas impactaram principalmente nas regiões mais quente, onde o volume de chuva também foi menor. Em propriedades com água reservada, a produção sofrerá um pouco menos. Enquanto em regiões onde houve a restrição do uso de irrigação, a queda será ainda maior”, frisa Galimberti.
No caso da falta d’agua, devido ao volume menor de chuva, o impacto na qualidade do produto é imediato, pois a excelência do café depende muito das boas condições em todo o seu ciclo. A falta de chuva no Norte e Noroeste do Estado, conforme Calegari, comprometeu o crescimento da planta no primeiro semestre e a florada, o pegamento, no segundo semestre.
“O problema desta colheita foi em 2015, com o período de estiagem muito prolongado. A planta florou, mas não tivemos água para formar o grão como normalmente acontece. Algumas floradas não pegaram direito por falta de chuva. Tivemos ainda pragas que atacaram o café. Essas pragas começaram devido à estiagem como a lagarta da roseta e a cochonilha, derrubando muito café”, lembraCalegari.
E com uma deficiência de nutrientes ou manejo equivocado, o café poderá perder sua qualidade.“Assim como os seres humanos, as plantas necessitam de água para sua sobrevivência, seu desenvolvimento correto e dos frutos. Em todos os elos do ciclo, a planta necessita da água, seja na florada ou no enchimento dos frutos. Em diversas regiões do Espírito Santo não houve chuvas suficientes nos meses que o mesmo precisava para sanar a demanda por água e isso comprometerá nas formações dos grãos, por consequência, a qualidade do mesmo”, comentaGalimberti.
Previsão de quebra para a safra
O potencial de produção do café conilon no Espírito Santo é de 12 milhões de sacas. No ano passado, esse número caiu para8 milhões e, neste ano,a previsão é de apenas 6 milhões de sacas do produto. “Estamos fazendo uma previsão de quebra para a safra de 20 a 25% do que nós colhemos em 2015”, diz Calegari.
Apesar da possível queda da safra, a produção menor ainda não refletiu no aumento dos preços. Pelo contrário, nas últimas semanas houve uma redução de R$ 30 nos preços do café – uma queda brusca e que nenhum produtor esperava. A explicação para isso estaria no café arábica.
“Eu acredito que quem tinha café arábica para exportar foi exportando e fazendo o seu caixa. No café de exportação sempre sobra um café mais fraco e, então, aplicaram esse café no consumo interno, pois é mais barato que o conilon. As indústrias diminuíram o conilon no blend e colocaram mais arábica. Como o arábica é mais barato, o mercado forçou o produtor que estava precisando vender, a oferecer o conilon um pouco mais barato para fazer o seu caixa”, explicaCalegari.
Contudo, para o gerente do Comércio Café daCoopeavi, João ElvídioGalimberti, a queda do valor da saca de café estaria muito mais associada ao início eminente da colheita. “Com a perspectiva de novo produto no mercado, aumenta a oferta e isso faz cair o valor pago pelo café, assim como qualquer outro produto no mercado. A expectativa de grãos novos gera esse efeito imediato no mercado”, diz.
Outro fator influenciador apontado por Galimberti é a variação do dólar. “Nos últimos dias a moeda norte-americana sofreu uma desvalorização diante do real, e como o preço do café está diretamente atrelado ao dólar, também sofre impacto”.
Custos maiores na produção
Segundo Galimberti, os custos de produção, neste ano, subiram bastante, principalmente devido à variação do dólar. Quase 100% da matéria prima para fazer os fertilizantes são importadas, regida pela moeda estadunidense. Com isso, o preço sobe na mesma escala do dólar.
“Os insumos e fertilizantes comprados para a última safra foram adquiridos com o câmbio mais desvalorizado, já os produtos utilizados nas lavouras desta safra sofreram reajustes devido ao dólar. Sem contar com o elevado índice de inflação registrado em 2015. Tudo isso influencia no custo de produção do café capixaba, elevando-o e diminuindo o lucro do produtor rural”, afirma.
E em função do clima, muitos produtores terão prejuízos, pois continuaram, mesmo com o período seco, a fazer manutenções na lavoura como adubações e pulverizações. Todavia, o produtor Saulo Piol, de Desengano, distrito de Linhares, espera o retorno da chuva para fazer os reparos na sua plantação.
“Adubar sem chuva não é viável. Por isso, estou torcendo para que chova, pois quero jogar adubo nas roças. Tenho adubo guardado desde janeiro. Eu não desanimo porque tive apenas perda de grãos este ano. Para o ano que vem, eu penso que vou colher bastante, pois minhas roças estão todas bonitas. Triste é na região de Marilândia, onde os pés estão todos morrendo, justamente no momento em que os produtores precisam vender para pagar custos de produção e financiamentos”, analisaPiol.
Conforme o gerente de comercialização da Cooabriel, Edmilson Calegari, os produtores que adquiriram dívidas para manter as manutenções, terão dificuldades parapagá-las devido à possívelqueda da produtividade. No entanto, a expectativa é que o preço do produto volte a subir.
“A esperança é que assim que terminar essa colheita, quando chegarmos a um resultado que comprove essa quebra que as pessoas, muitas vezes, não acreditam, possamos ter um novo potencial para que novamente os preços voltem a subir, a remunerar”, finaliza Calegari.
Matéria publicada na página 03 da edição do Jornal O PIONEIRO 20 de março de 2016