Flexibilidade de horário, preços atrativos e comodidade são algumas das vantagens dos cursos a distância. O que muita gente não sabe é que essa modalidade, em pleno crescimento na área da educação, é uma prestação de serviço submetida ao Código de Defesa do Consumidor (CDC). Por isso, o estudante precisa ficar atento na hora de comprar esse tipo de produto.
O primeiro passo antes de contratar um curso on-line é conferir se é reconhecido pelo Ministério da Educação (MEC) e se a instituição está autorizada a oferecer o serviço. A busca pode ser feita pelo portal do MEC. Vale esclarecer que as escolas de educação básica são de responsabilidade das secretarias municipais ou estaduais de educação, inclusive as escolas da rede privada. O credenciamento do MEC trata, portanto, de curso do ensino superior (graduação e pós-graduação).
O advogado Lucas Barroso, professor e especialista em Direito do Consumidor, orienta também pesquisar em sites de reclamação. “Geralmente as instituições estão credenciadas e é simples verificar esse registro. Mas o principal é o estudante avaliar se aquilo é realmente o que ele procura e precisa. Observar se a instituição tem um nome no mercado e pesquisar sites de reclamação”, orienta.
De olho no contrato
De acordo com dados do Censo da Educação, realizado pelo Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep), o ingresso na modalidade de ensino a distância aumentou em 23,3% de 2020 para 2021. Já o ensino presencial passou por queda de 16,5% no mesmo período.
Barroso explica que esse tipo de contratação nada mais é do que uma prestação de serviço. “Se for uma instituição privada, é um contrato de prestação de serviço educacional. E o aluno pode e deve exigir que o contrato seja cumprido”, aponta o advogado.
Uma dica valiosa é ler todas as informações disponíveis, especialmente em contratos e anotar protocolos de atendimento. A supervisora do Procon Assembleia, Giovanna Chiabai, orienta que o consumidor esteja atento, especialmente, às cláusulas de cancelamento, ao prazo para desistência e às multa previstas, ou seja, aos artigos do contrato que tratam das penalidades e das obrigações.
Outros aspectos do contrato também precisam ser verificados pelo consumidor, como a carga horária oferecida, a emissão de certificado de conclusão e até mesmo o atendimento ao aluno. Giovanna Chiabai observa que há cursos “gestados em estados diferentes do estado em que reside o consumidor, não oferecendo o devido suporte em termos de atendimento.”
Com relação à parte financeira, alerta o advogado Lucas Barroso, “caso o contrato não seja cumprido, o aluno pode pedir um desconto ou até solicitar a devolução de mensalidades, dependendo do caso. No extremo, poderia se pensar até uma indenização por danos morais.”
Uma das dúvidas recorrentes é com relação à aplicação de multa em casos de cancelamento pelo consumidor. Barroso explica que, havendo previsão em contrato, a multa pode ser cobrada, mas ela precisa ser razoável:
“A instituição não pode vender um curso de R$ 12 mil e cobrar uma multa de R$ 10 mil, por exemplo. A multa precisa ser razoável, normalmente entre 15% e 20%, para cobrir despesas operacionais da empresa”, afirma o advogado. A supervisora do Procon Assembleia lembra que há casos em que a multa, em caso de desistência, chega a 40% do valor do contrato, o que é abusivo. “O consumidor não vai pagar pelo que não usufruiu”, diz Chiabai.
Buscando ajuda
A estudante Danielle Demuner se inscreveu em um curso de graduação em formato híbrido, em fisioterapia, em uma faculdade de Vitória. “Iniciei o curso em 2022 e o acordado era pagar uma mensalidade de R$ 350,00 durante o primeiro ano. Seis meses depois, o valor foi alterado. Além disso, o prometido seria um reajuste anual entre 5% e 11% em 2023. Quando vi a grade de disciplinas e solicitei o primeiro boleto, o valor era mais de R$ 1.000,00.”.
Segundo a estudante, ao reclamar com a instituição sobre a cobrança, a faculdade solicitou o protocolo de atendimento no qual foi acordado o valor. “Eu tinha o protocolo. Mas a empresa me informou que os dados são arquivados apenas por três meses. Acabei trancando a minha matrícula. E ainda me cobraram mais de R$ 2 mil pela desistência. Fiquei devendo e com o nome sujo”, contou a estudante, que buscou orientação no Procon Assembleia.
Giovanna Chiabai recomenda que, nas operações de compras virtuais, o consumidor printe as telas com as informações que vão sendo fornecidas, principalmente as de risco, como as que tratam de cancelamento, quebra de contrato, suspensão e valores. Com essa medida, “você pode futuramente se proteger de uma cobrança indevida, de um cancelamento indevido, de uma proibição que antes era oferecida como permissão, no momento de fazer o contrato”. A supervisora do Procon Assembleia lembra também sobre a importância de exigir recibos dos pagamentos feitos.
Outros canais de atendimento
Além do Procon, o consumidor também pode procurar o Ministério Público ou utilizar ainda o site consumidor.gov.br. “É um serviço público e gratuito que possibilita a interlocução entre consumidor e empresa com foco na solução de conflitos. O site é monitorado pela Secretaria Nacional do Consumidor, do Ministério da Justiça. Atualmente, 80% das reclamações registradas são solucionadas pela empresa por meio da plataforma”, sugere Barroso.
Segundo o advogado, o acordo é sempre a primeira opção. “Orientamos tentar resolver por acordo, buscar o que é menos desgastante. Se não conseguir, procurar os canais disponíveis para o consumidor, como o Procon e o Ministério Público, que tem uma área específica para tratar esses casos. Na estrutura do Poder Judiciário, o consumidor pode procurar os juizados especiais cíveis”, explica o advogado. O MEC também recebe denúncias pelo telefone 0800-616161.
Código de Defesa do Consumidor
Cursos contratados pela internet ou pelo telefone são considerados compras fora do estabelecimento comercial. Nesses casos, o artigo 49 do CDC garante o direito ao arrependimento, com o cancelamento da compra virtual sem justificativas e sem ônus em um prazo de sete dias após a aquisição.
Os direitos gerais previstos no CDC também se aplicam às compras virtuais. É o caso, por exemplo, do direito básico a informações claras sobre o produto ou serviço: preço, disponibilidade, forma de entrega, prazos, valores adicionais, entre outros descritos no artigo 31 do código. Nos cursos a distância, o estudante deve observar as informações relativas à grade curricular, carga horária, prazos e disciplinas, por exemplo.
A relação de consumo em ambiente digital ganhou um reforço com a regulamentação do e-commerce (Decreto Federal 7.962/2013). A norma trouxe deveres específicos para as lojas virtuais, garantindo informações claras a respeito do produto, facilitando o acesso aos dados de identificação da empresa e também facilitando o atendimento ao consumidor.
Outra legislação que protege o consumidor nesse ambiente é a Lei Geral de Proteção de Dados Pessoais (Lei 13.709/2018). A legislação obrigou os sites a terem políticas de privacidade e proteção de dados mais transparentes e determinou também o tratamento seguro das informações dos clientes, reduzindo o risco de acesso não autorizado.
Por Ales
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